Proporção de mortes provocadas por PMs ou civis chega a 40% na capital; especialista vê uso excessivo da força policial e alerta para escalada da letalidade.
Por Cíntia Acayaba | g1 SP
A cada dez assassinatos registrados na cidade de São Paulo, quatro foram cometidos por policiais militares ou civis em 2024, segundo o 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado nesta quinta-feira (24).
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Corpo de marco Aurélio, estudante de medicina morto pela PM — Foto: Reprodução/TV Globo |
👉 Na capital, 357 pessoas foram mortas pela polícia no ano passado, o equivalente a 40% das 937 mortes violentas registradas.
As mortes violentas incluem:
- homicídio doloso
- latrocínio
- lesão corporal seguida de morte
- feminicídio
- morte decorrente de intervenção policial
Para Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, é incorreto justificar o número elevado de mortes por policiais com o argumento de que a taxa de homicídios dolosos é baixa na cidade.
A polícia pode usar da força, mas isso é de acordo com a violência do território. Se 4 em cada 10 mortes foi a polícia que provocou, a questão não é que o motivo é ter pouco homicídio, e sim que a polícia mata desproporcionalmente.
— Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública afirmou que a letalidade policial teve queda de 3,8% nos primeiros cinco meses deste ano (leia nota completa abaixo).
Segundo Samira, o gráfico das dez cidades com maiores taxas de Mortes Violentas Intencionais do Brasil ajuda a explicar a proporção.
"São dez cidades no Nordeste, três no Ceará, duas em Pernambuco. Nessas cidades, a polícia responde por 2% a 3% das mortes. Mas a Bahia, que tem cinco cidades nessa lista, tem em média uma em cada quatro mortes praticadas por policiais, e em algumas cidades chega a metade", diz.
"Ou seja, tem lugar em que a polícia é parte da solução, mas tem lugar em que a polícia é parte do problema. Em São Paulo, ela voltou a ser parte do problema com [o governador] Tarcísio Gomes de Freitas", completa.
Segundo a diretora, quando a proporção de mortes por policiais passa de 10% já é sinal de uso excessivo da força.
“Isso não significa ignorar a presença de facções ou disputas, mas mostrar que há lugares onde a polícia mata mais do que o crime, como aconteceu em Santos e São Vicente no ano passado”, aponta.
Segundo o Anuário, em Santos e São Vicente, 66,1% das mortes foram cometidas por policiais.
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SP teve o maior crescimento da letalidade policial do Brasil em 2024 — Foto: Arte/g1 |
Operações policiais letais
Tanto em 2024 quanto em 2023, a Polícia Militar realizou operações na Baixada Santista. Elas foram consideradas as mais letais desde o massacre do Carandiru, com 56 mortos, no ano passado, e 28, em 2023.O escalonamento da violência na gestão Tarcísio ganhou repercussão em 2024 com casos que envolvem "mortes de não matáveis", como o menino Ryan, de apenas 4 anos, morto por um tiro durante um confronto policial no Morro São Bento, em Santos, em novembro.
Em abril, outra criança, Kauan, de 7 anos, perdeu a visão de um dos olhos após ser ferido durante um confronto policial na comunidade de Paraisópolis, na Zona Sul de São Paulo. A criança estava com a mãe a caminho da vizinha, quando foram surpreendidos pela troca de tiros.
Além das crianças atingidas, a PM matou um estudante de medicina, na Vila Mariana, Zona Sul de São Paulo.
Marco Aurélio foi morto com um tiro à queima-roupa, na escadaria de um hotel na Rua Cubatão. Os PMs estavam em patrulhamento pelo bairro quando o jovem passou, deu um tapa no retrovisor da viatura e correu.
O jovem foi para o interior de um hotel na região, e os policiais o perseguiram. As câmeras corporais dos PMs mostram que um dos agentes tentou puxar pelo braço o estudante, que estava sem camisa, enquanto o outro o chutou. Em seguida, o estudante segurou a perna do policial, que caiu no chão. Durante a confusão, um dos PMs atirou na altura do peito do estudante.
Segundo o estudo, mais de seis mil pessoas por ano morreram no país em intervenções policiais:
"Causa preocupação o fato de que, apesar da redução dos homicídios registrada nos últimos anos, o número de mortos em intervenções policiais permanece em patamares alarmantes, vitimando, desde 2018, mais de seis mil pessoas por ano no país. Se considerarmos a última década, entre 2014 e 2024 foram 60.394 vítimas de letalidade policial", diz trecho do documento.
O que diz a SSP
"São Paulo é o estado com a menor taxa de homicídios do país, segundo o próprio Fórum Brasileiro da Segurança Pública. O número de ocorrências dessa natureza é o menor desde 2001, quando os casos passaram a ser contabilizados. Os casos de latrocínio também estão em queda, com redução de 26,5% no acumulado do ano. Os resultados demonstram o trabalho integrado das forças de segurança do Estado.Os casos de Morte Decorrente de Intervenção Policial (MDIP) também estão em queda e já apresentaram uma redução de 3,86% nos primeiros cinco meses do ano ante o mesmo período de 2024. Todos os casos dessa natureza são investigados pelas corregedorias das polícias Civil e Militar, com acompanhamento do Ministério Público e do Poder Judiciário."
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