Penalista diz que proibição de entrevistas não configura censura a Bolsonaro

Para o especialista João Vitor Vieira, o ato de conversar com a imprensa e ter a fala retransmitida em redes sociais pode caracterizar violação de medida cautelar imposta pelo STF


Por Wal Lima | Correio Braziliense

O endurecimento das medidas cautelares impostas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a ser discutido, nesta semana, após ele conceder entrevista à imprensa na segunda-feira (21/7), durante visita ao Congresso Nacional, enquanto usava tornozeleira eletrônica. Apesar de a defesa do ex-presidente alegar desconhecimento da decisão que proibiu o uso de redes sociais por terceiros, especialistas em direito penal apontam que a conduta pode configurar violação das determinações impostas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

No caso de Bolsonaro, uma das condições estabelecidas pela justiça foi a proibição do uso de redes sociais - (crédito: Minervino Júnior/CB)

Segundo o advogado criminalista João Vitor Vieira, especialista em direito processual penal, a restrição imposta por decisão judicial não se trata de censura, como sustentado por aliados de Bolsonaro, mas do cumprimento de uma medida cautelar válida.

“As medidas cautelares diversas da prisão têm por objetivo, dentre outros, garantir o regular curso de uma investigação ou processo em andamento, assegurar a aplicação da lei penal e evitar prisões desnecessárias. Essas medidas podem ser endurecidas se o magistrado do caso entender necessário, conforme previsão do artigo 282, § 4º, do Código de Processo Penal”, explica o advogado, em entrevista ao Correio.

No caso do ex-presidente, uma das condições estabelecidas pela justiça foi a proibição do uso de redes sociais, seja de forma direta ou por intermédio de terceiros. Para Vieira, essa restrição é clara e fundamentada, e pode ter sido violada diante da entrevista concedida e posteriormente divulgada nas redes sociais por aliados, como o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

“Considerando que entrevistas à imprensa podem ser facilmente repercutidas ou transmitidas em redes sociais por apoiadores, haveria, em tese, uma violação da medida cautelar imposta. Tal descumprimento poderia ensejar o agravamento das restrições ou, até mesmo, a revogação da liberdade em favor de medida mais severa”, pontua.

O advogado lembra que essa não é a primeira vez que a Justiça impõe limitações à comunicação de investigados ou réus com a imprensa. “Basta recordarmos do caso da advogada Deolane Bezerra, que, em setembro de 2024, foi proibida de falar com a imprensa durante o cumprimento de medida cautelar. Ao descumprir essa condição, retornou à prisão, sendo liberada apenas alguns dias depois”, cita.

Vieira também menciona o episódio envolvendo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2018, quando esteve preso em Curitiba. “Situação semelhante ocorreu com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2018, quando, durante o período em que esteve preso, foi proibido de conceder entrevistas. À época, inclusive, determinou-se que, caso alguma entrevista fosse concedida e divulgada, quem a divulgasse poderia responder por desobediência.”

Para o especialista, é necessário compreender a medida como parte do processo judicial e não como um ataque à liberdade de expressão. “Dessa forma, não se configura censura, mas sim o cumprimento de decisão judicial devidamente fundamentada, que impõe uma medida cautelar diversa da prisão, a qual deve ser respeitada enquanto vigente”, conclui João Vitor Vieira.

O caso de Bolsonaro segue sob análise do ministro Alexandre de Moraes, relator dos inquéritos em que o ex-presidente é investigado. Caso fique configurado o descumprimento das medidas, o STF poderá endurecer as restrições, inclusive com possibilidade de prisão preventiva.

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